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Parabrigar

Allan T.Yzumizawa

Um/a jovem durante uma manifestação política nas ruas – por efeito de sua ira contra os abusos do sistema – arremessa um tijolo contra a vidraça de uma grande instituição, a qual simboliza o poder opressor pelo qual é afetado/a. Diante desse impacto gerado por sua impetuosidade, a ação do tijolo estilhaça os vidros pelo chão da cidade, enquanto outros/as protestantes atropelam esses fragmentos de cacos com seus passos acurados e emanando gritos de suas reivindicações.

Trago esta imagem da “revolta”, encontrada nos subsolos de minha memória, a qual marcou pessoalmente o período de protestos de junho de 2013, no Brasil. Momento histórico importante e crucial para o anúncio de mudanças dentro do cenário político do país, tanto quanto a própria forma de articular os discursos políticos/estéticos em nossa sociedade. Não à toa, todas essas sensações logo foram disparadas ao me deparar com o trabalho Parabrigar (2021), de Helô Sanvoy. Nele, o artista nos apresenta um objeto composto por tijolos e cacos de vidro temperado. Esses dois materiais são ligados de maneira simétrica a partir da reunião dos estilhaços de vidro, dos quais são organizados condensadamente de modo a espelhar a forma do tijolo. Ambos os materiais possuem uma densidade, ao mesmo tempo que visualmente apresentam um contraste a partir da transparência dos cacos de vidro, contrapostos com a opacidade dos tijolos e dos blocos de construções: a sedução delicada e perigosa, contra a maciça brutidão.

Esse objeto estático – exposto ao chão – condensa dentro de sua forma sólida (substantivo) um potencial cinético (verbal). A nossa mente logo é provocada a explorar as disjunções de ações possíveis que esse trabalho pode nos apontar. Os cacos de vidro localizados habitualmente pelo chão – esgotados de sua entropia – são reunidos novamente (um “retorno recalcado”) pelo artista de modo a se conectar com o material responsável pela sua própria destruição. Talvez seja nesse ponto em que somos provocados/as pelo título do trabalho, possibilitando o contorno de uma ambiguidade contida em seu entendimento a partir da agressividade nas palavras “para brigar”, ou da ação de acolhimento e cura “para abrigar”. Helô Sanvoy, nesse caso, sugere o desvio da utilidade construtiva do tijolo, para o seu potencial destrutivo, como forma de inflamar o seu manuseio para o desmoronamento de estruturas, estas simbolizadas pelas instituições hegemônicas que se compuseram durante a nossa história. Ao mesmo tempo, o objeto nos soa como uma esperança de um fragmento que ainda restitui um potencial de re-construção, diante do nosso atual cenário devastado.

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